Atos dos Opostos

Dismistificando o ritual do trote universitário

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O ritual do trote

O artigo a seguir, busca retomar fragmentos de reflexões elaboradas a partir das perspicazes análises sobre a condição humana, feitas sobretudo por Freud e Nietzsche. Particularmente, consideramos o modelo mais comum de trote como mais um ritual sadomasoquista de integração. Esperamos explicitar aos educadores as contradições de nossa contingência humana e os laços arquetípicos que nos mantém encalacrados na barbárie, incapazes que somos de rompê-los e nos libertarmos desses grilhões que continuam dificultando a construção do humano entre nós. Este pequeno texto não é apenas o registro de uma análise rigorosa e crítica do trote universitário, trata-se de uma reflexão serena e firme sobre a própria formação humana, naquilo que ela tem de mais precioso: o poder de transformar os indivíduos em pessoas dignas, ou não.
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Alguns entendidos no assunto definem o trote universitário como sendo uma espécie de ritual onde os estudantes recém chegados chamados de calouros, se inserem numa nova fase de sua vida.

A palavra "trote" possui correspondentes em vários idiomas, como trote (espanhol), trotto (italiano), trot (francês), trot (inglês) e trotten (alemão). Em todos estes idiomas, e também em português, o termo se refere a uma certa forma de se movimentar dos cavalos, uma andadura que se situa entre o passo (mais lento) e o galope (mais rápido).

Deve se ter em conta que o trote não é uma andadura normal e habitual do cavalo, mas algo que deve ser ensinado a ele (muitas vezes à base de chicotadas e esporadas). Da mesma forma, o calouro é encarado pelo veterano como algo (mais que um animal, mas menos que um ser humano) que deve ser domesticado pelo emprego de práticas humilhantes e vexatórias; em suma, o calouro deve "aprender a trotar".

Bixo ou bixete

Da mesma forma, denominar o calouro de bixo (ou bixete, se for mulher), parece querer indicar "que o calouro deve ser humilhado a ponto de nem mesmo merecer que a palavra bicho seja escrita corretamente".

Segundo algumas teorias, o trote teve origem na Idade Média, quando os candidatos aos cursos de universidades europeias assistiam as aulas dos vestíbulos (local para guarda das vestimentas dos alunos) porque lhes era proibido frequentar as salas de aula dos alunos mais antigos.

Como naquela época a higiene pessoal não andava muito na moda na Europa, ou seja, não estava no topo das prioridades dos habitantes medievais, os novatos acabavam tendo seus cabelos raspados e roupas queimadas, como uma forma de evitar a transmissão de doenças.

Até então não havia nada de mais, no entanto, uma série de fatores negativos da natureza humana acabou aflorando de forma que algumas pessoas perceberam neste ritual uma forma de compensar suas frustrações diárias. Então começaram as práticas vexatórias, dolorosas e muitas vezes mortais entre alunos.

Assim como hoje, naquela época a capacidade primata humana de imitar sem pensar, já estava presente no modo de vida local, de forma que o trote passou a se espalhar pelo mundo afora, afinal se o líder do bando disse que é legal deve ser mesmo.

Na maioria das vezes o calouro é colocado em situações onde seu cabelo é raspado, o corpo é pintado, tem que sair às ruas pedindo dinheiro, recebe uma descarga de algo fedorento como ovo podre, tem que encher a cara com uma birita, etc. Já em outras, as coisas podem tomar um rumo mais violento.

As situações humilhantes são dos mais diversos tipos e variam de acordo com grau de neurose baixa autoestima dos veteranos mancomunados no esquema e dos exemplos a que eles tiveram acesso.

Pesquisa feita por especialistas pesquisadores aponta o perfil de veteranos relacionados com trotes ignorantes menos adequados à convivência social, como sendo oriundos de um habitat lar com problemas. 53% dos veteranos analisados se disseram filhos de pais repressores, 41% não tem coragem de admitir sua bissexualidade, 35% acham que a(o) novata(o) é mais inteligente ou bonita(o) e que isso pode representar uma ameaça futura e 78% afirmou que se o veterano mor mandar tem que obedecer, por outro lado 11% admitiu que mascar chiclete com óculos escuros é muito "style".

Quanto aos alunos novos, a pesquisa indicou ainda, que a maioria, cerca de 82%, se submete aos vexames como uma forma de se inserir no novo grupo, 23% admitiu que só participou para tirar uma onda com a galera, enquanto 59% dos que não conseguiram escapar, não faria aquilo se houvesse outra alternativa.


(calouro)
Zuaram meu cabelo, minha roupa, eu fiquei todo sujo de tinta de carimbo azul e fedendo, pois me deram banho de "perfume" (uma mistura de óleo de fritura velho, com outras gororobas curtida numa garrafa pet)

(veterano)
Eu acho legal, cara, tô no 3º período de administração de empresas e não vejo nada de mais em fazer estas brincadeiras com esta calourada... Quando eu entrei já era assim! É uma forma de estabelecer uma certa hierarquia, sabe. Isso já existe desde o tempo do ariri pistola.


(estudante de filosofia)
O trote como vocês costumam chamar nada mais é do que uma forma social de expor as emoções num contexto ambíguo que se relaciona com a cultura e as vivências pedagógicas intrínsecas, sobretudo na sociedade contemporânea onde as vicissitudes são latentes e perpendiculares entre si...

(calouro masoquista fazendo média ao lado dos veteranos)
Essa integração com os alunos mais velhos é o que conta. É muito gratificante estar aqui na presença destas pessoas tão ilustres, é uma experiência única que vale para toda a vida. Se pudesse faria tudo isso de novo no ano que vem. É demais! Coisa de loco!


Até então tratamos de aspectos negativos do trote, mas convém lembrar que há os trotes solidários onde alunos participam de atividade realmente úteis à comunidade, seja doando sangue, ajudando uma entidade assistencial, plantando uma árvore ou simplesmente não fazendo aquela papagaiada toda.

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